UNIDOS DA PEDRA DO REINO - SÉRGIO VAZ
Pois é povo lindo e inteligente deste país, depois de mais um ano de espera ,até que enfim é Carnaval. Dizem alguns que no país o ano só começa depois das folias de Momo. Para alguns eu acho que sim, para outros acho que o ano nunca começa como devia ter começado.
Mas enfim, como a vida sempre desafina, são aqueles que seguram as cordas é que mantem os trios ...életricos nos trilhos.
O Carnaval é o Prozac do país, por onde quer que você olhe as pessoas estão felizes. Ou parecem que estão. Sei lá, deixa a cuíca roncar, não quero atravessar o samba de ninguém, só queria entender o refrão.
Nunca fui um folião do tipo confete e serpentina, ou Pierrot diante de qualquer Colombina, o samba nunca esteve ou passou pelos meus pés, sambando estou mais para o robocop.
Passista frustado, as minhas fantasias coloco na vida real.
Sem brilho nenhum, nunca tirei dez em nenhum quesito qualquer, mas apesar da falta de ginga, como quase todo brasileiro, também gosto de Carnaval.
Pena eu não ser uma cria da avenida como realmente gostaria de ser. Queria que cada veia minha fosse uma corda de cavaquinho, e mesmo sem saber batucar em caixa de fósforo, já quis ser mestre de bateria e atear fogo no ouvido da multidão. Mas tenho que admitir que estou muito mais para quarta-feira de cinzas do que praça da apoteóse.
O Carnaval é quando o povo decreta a felicidade, nem que seja apenas, por quatro míseros dias.
Falando em escolas de samba -essa beleza fantástica criada pelas mãos calejadas e abençoadas pelo suor do povo brasileiro-, parece que elas saíram das aventuras do livro de Ariano Suassuna “A pedra do reino", e os seus personagens parece que foram escritos especialmente pela alas dos compositores Mário Quintana do cavaco, Manoel de Barros do pandeiro e Eduardo Galeano do morro da poesia.
Se liga nos nomes que atravessam a avenida com uma caneta atravessa o papel: pavilhão, mestre-sala e porta-bandeira, ala das baianas, harmonia, evolução, mestre de bateria, rainhas e princesas, carro alegórico, tamborim, alegoria, abre-alas, comissão de frente, velha-guarda, e por aí segue o poema.
Essas palavras, todas elas, rimam com gente simples, que é um outro poema bonito de se ler.
Por ter sido sempre da ala da melancolia, o carnaval soa pra mim como um velho samba antigo na voz triste do mestre Cartola, e o meu coração, esse puxador de samba da memória, mais parece um velho palhaço perdido no meio do salão.
Nesse mundão velho e fora de ritmo, o povo brasileiro é o único que consegue transformar sofrimento em festa, sem usurpar a alegria de ninguém.
E com o suor pisado no rosto e o sangue escorrendo nos pés, a gente entoa um mantra: do Jair Rodrigues como se implorasse aos céus:
“... tristeeeeza por favor vai embora.”
*do livro "Literatura, pão e poesia" Global Editora
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